A TV brasileira passou por uma série de mudanças no decorrer dos últimos dez anos. Houve a queda da participação das TVs, a migração do telespectador para a internet e outros tipos de mídia, a ida do SBT para o terceiro lugar e a subida da Record para a vice-liderança.
A Record investiu como nunca e montou uma estrutura que jamais havia sido vista na televisão brasileira por uma concorrente da Globo. Jamais havia se investido e produzido tanto com o objetivo de bater a emissora carioca. Nem mesmo a Manchete, que apesar de mais diversificada, tinha tamanha sede e investimentos.
O crescimento da Record em estrutura foi bastante marcante. Só que houve uma sucessão de erros. Para que o crescimento avassalador pudesse ocorrer, a emissora cortou intervalos (de 12h às 20h, por exemplo, raramente se chega a mais de seis intervalos, quantidade a qual o SBT dispara apenas entre 14h30 e 17h) e aposta no jornalismo policial, que teve como auge na década de 90 e que até então funcionava, ainda mais quando aliado a uma grande estrutura. Além disso, também houve investimentos maciços na dramaturgia, que se rendeu novamente à tramas policialescas.
Tudo ia muito bem até que em 2009 a Record começou a perder espaço. Os índices de audiência começaram a cair e houve uma série de desfalques para o SBT. A crise fez com que a emissora pudesse rever alguns conceitos. Entretanto, agora em 2011, a crise foi agravada e dessa vez os problemas se encontram na metodologia do canal de trabalhar com TV.
O primeiro dos exemplos pode ser encontrado até mesmo na faixa da tarde. O "Cidade Alerta" chegou a ter quase três horas de duração em uma trágica tentativa de repetir os índices do passado com matérias policiais. Durante todo o tempo em que esteve no ar, o programa não soube na prática qual era o plural da palavra intervalo. O Ibope até reagiu durante as primeiras semanas e foi despencando. O que havia de errado? Era jornalismo policial com Datena - e posteriormente com os outros apresentadores - em uma grande estrutura e sem intervalos. Ou seja, estavam no limite máximo. E os índices em queda. A receita parou de funcionar. E agora?
A ideia de focar no policialesco como se o mesmo fosse salvação de todos os problemas teve proporções tão grandes que a ordem expedida às filiais era que todos os jornais fossem apresentados de pé e que focassem sua linha editorial para as manchetes policiais. Salvo o "DF Record", de Luiz Carlos Braga, que por sinal mantém um excelente nível, e um ou outro jornal de interior, todos eles foram reformulados para atender às exigências da matriz. O "Rio Grande Record", assim como toda a Record Rio Grande do Sul, foi uma das mais afetadas. Perdeu muito da qualidade que tinha, ainda mais no noticiário noturno que se aproximou e muito do padrão do "RBS Notícias".
Apenas para exemplificar, na última quinta-feira (22) o "SP Record", da matriz, mudou de grade mais uma vez (calcula-se que seja a centésima décima primeira mudança do ano na grade, segundo estudo feito por uma das concorrentes da Record).
Houve aposta na cobertura de um caso no qual um aluno atirou na professora e depois cometeu suicídio. Um prato cheio para quem teve 18 pontos com a cobertura do Caso Nardoni anos atrás. Só que o Ibope não correspondeu. A média foi de apenas 3,7 pontos. O pico de 6 só foi dado porque "Todo Mundo Odeia o Chris" ajudou. A Band também não teve aquela audiência toda que o caso merecia e fechou só com 6 pontos.
As falhas na metodologia da Record podem ser vistas de forma ainda mais nítida na dramaturgia. "Rebelde" e "Vidas em Jogo" foram lançadas neste ano e a emissora finalmente voltava a ter dois horários de dramaturgia. Apesar disso, todos sabiam que haveria um penhasco de diferença no que diz respeito aos investimentos.
"Rebelde" tem um orçamento de R$ 40 milhões, que é o quádruplo da mal sucedida "Alta Estação", mas é menos da metade dos mais de R$ 90 milhões despejados em "Vidas em Jogo". "Rebelde" reúne poucos nomes consagrados do casting da Record, como Adriana Garambone e Floriano Peixoto. Houve foco maior na contratação de jovens atores ou daqueles que já estavam há algum tempo sem destaque, como Edwin Luisi e Cristina Mullins. A direção é de Ivan Zettel, que fez a simpática mas um tanto despercebida "Luz do Sol".
"Vidas em Jogo", por sua vez, trouxe Betty Lago, Paulo César Grande, Beth Goulart, Guilherme Berenguer, entre outros à Record, além de reunir tudo que o canal tinha de melhor. Também estão na novela Lucinha Lins, Luciana Braga, Ricardo Petraglia, André di Mauro, Simone Spoladore, Leonardo Vieira, Denise del Vecchio... E a direção geral é de Alexandre Avancini, dos grandes sucessos "Prova de Amor", da trilogia "Os Mutantes", da bem elogiada "A Lei e o Crime", de "Vidas Opostas"...
"Rebelde" tem uma temática jovem e restrita. A história se sustenta no cotidiano de adolescentes que buscam identidade. A produção é limitada. Externas fora da escola e da cidade cenográfica desde a estreia podem ser contadas nos dedos de uma mão. Nunca foi mostrado um revólver sequer.
Já "Vidas em Jogo" acumula uma série de explosões, perseguições, constantes trocas de tiros, sequestros e etc. E o Ibope? Não raramente "Rebelde" bate "Vidas em Jogo". A novela de Margareth Boury oscila entre 9 e 11 pontos de média enquanto a de Cristianne Fridman tem entre 10 e 13 pontos. Só lembrando que tais índices são muito próximos aos de "Ribeirão do Tempo" e "Poder Paralelo", tramas que fugiam totalmente do que sempre havia dado certo na Record. Sinal de desgaste na fórmula?
Por fim, até o próprio "Domingo Espetacular", considerado como prata da casa, tem sentido os efeitos de mudança no comportamento do telespectador e que velhas receitas não funcionam tão bem assim.
Porém, diferente de outros programas, a equipe soube prever o desgaste do processo e passou a recorrer a outras fórmulas. Grandes reportagens relacionadas a assaltos e cenas de violência, por exemplo, deixaram de chamar tanta atenção assim. Há alguns domingos mesmo o "Domingo Espetacular", em um dado momento, estava com 18 pontos contra 20 da Globo. A matéria no ar? Uma sobre os cachorros de famosos.
Há algum tempo mais, em outro momento curioso, a revista eletrônica estava com 21 pontos. Alguma operação policial? Alguma investigação? Não. Era uma matéria que exaltava o sucesso da carreira de Rodrigo Faro. Inclusive, índices similares foram atingidos quando Gugu e Silvio Santos foram homenageados.
Tudo isso serve apenas para ratificar que não existe uma receita para dar audiência na TV. Televisão mexe diretamente com comportamento das pessoas. O telespectador gosta e tem exigido material de qualidade. Mas ele não é mais tão vulnerável como antigamente.
Fazer uma série de reportagens em um dia e exibí-las repetitivamente das 06h às 14h30, passando por todos os programas sem exceção, já não rende mais. Recorrer a tiros nas novelas também não. Poupar intervalos? Até ajuda, mas se o produto não for bom, a audiência não se salva.
A Record investiu como nunca e montou uma estrutura que jamais havia sido vista na televisão brasileira por uma concorrente da Globo. Jamais havia se investido e produzido tanto com o objetivo de bater a emissora carioca. Nem mesmo a Manchete, que apesar de mais diversificada, tinha tamanha sede e investimentos.
O crescimento da Record em estrutura foi bastante marcante. Só que houve uma sucessão de erros. Para que o crescimento avassalador pudesse ocorrer, a emissora cortou intervalos (de 12h às 20h, por exemplo, raramente se chega a mais de seis intervalos, quantidade a qual o SBT dispara apenas entre 14h30 e 17h) e aposta no jornalismo policial, que teve como auge na década de 90 e que até então funcionava, ainda mais quando aliado a uma grande estrutura. Além disso, também houve investimentos maciços na dramaturgia, que se rendeu novamente à tramas policialescas.
Tudo ia muito bem até que em 2009 a Record começou a perder espaço. Os índices de audiência começaram a cair e houve uma série de desfalques para o SBT. A crise fez com que a emissora pudesse rever alguns conceitos. Entretanto, agora em 2011, a crise foi agravada e dessa vez os problemas se encontram na metodologia do canal de trabalhar com TV.
O primeiro dos exemplos pode ser encontrado até mesmo na faixa da tarde. O "Cidade Alerta" chegou a ter quase três horas de duração em uma trágica tentativa de repetir os índices do passado com matérias policiais. Durante todo o tempo em que esteve no ar, o programa não soube na prática qual era o plural da palavra intervalo. O Ibope até reagiu durante as primeiras semanas e foi despencando. O que havia de errado? Era jornalismo policial com Datena - e posteriormente com os outros apresentadores - em uma grande estrutura e sem intervalos. Ou seja, estavam no limite máximo. E os índices em queda. A receita parou de funcionar. E agora?
A ideia de focar no policialesco como se o mesmo fosse salvação de todos os problemas teve proporções tão grandes que a ordem expedida às filiais era que todos os jornais fossem apresentados de pé e que focassem sua linha editorial para as manchetes policiais. Salvo o "DF Record", de Luiz Carlos Braga, que por sinal mantém um excelente nível, e um ou outro jornal de interior, todos eles foram reformulados para atender às exigências da matriz. O "Rio Grande Record", assim como toda a Record Rio Grande do Sul, foi uma das mais afetadas. Perdeu muito da qualidade que tinha, ainda mais no noticiário noturno que se aproximou e muito do padrão do "RBS Notícias".
Apenas para exemplificar, na última quinta-feira (22) o "SP Record", da matriz, mudou de grade mais uma vez (calcula-se que seja a centésima décima primeira mudança do ano na grade, segundo estudo feito por uma das concorrentes da Record).
Houve aposta na cobertura de um caso no qual um aluno atirou na professora e depois cometeu suicídio. Um prato cheio para quem teve 18 pontos com a cobertura do Caso Nardoni anos atrás. Só que o Ibope não correspondeu. A média foi de apenas 3,7 pontos. O pico de 6 só foi dado porque "Todo Mundo Odeia o Chris" ajudou. A Band também não teve aquela audiência toda que o caso merecia e fechou só com 6 pontos.
As falhas na metodologia da Record podem ser vistas de forma ainda mais nítida na dramaturgia. "Rebelde" e "Vidas em Jogo" foram lançadas neste ano e a emissora finalmente voltava a ter dois horários de dramaturgia. Apesar disso, todos sabiam que haveria um penhasco de diferença no que diz respeito aos investimentos.
"Rebelde" tem um orçamento de R$ 40 milhões, que é o quádruplo da mal sucedida "Alta Estação", mas é menos da metade dos mais de R$ 90 milhões despejados em "Vidas em Jogo". "Rebelde" reúne poucos nomes consagrados do casting da Record, como Adriana Garambone e Floriano Peixoto. Houve foco maior na contratação de jovens atores ou daqueles que já estavam há algum tempo sem destaque, como Edwin Luisi e Cristina Mullins. A direção é de Ivan Zettel, que fez a simpática mas um tanto despercebida "Luz do Sol".
"Vidas em Jogo", por sua vez, trouxe Betty Lago, Paulo César Grande, Beth Goulart, Guilherme Berenguer, entre outros à Record, além de reunir tudo que o canal tinha de melhor. Também estão na novela Lucinha Lins, Luciana Braga, Ricardo Petraglia, André di Mauro, Simone Spoladore, Leonardo Vieira, Denise del Vecchio... E a direção geral é de Alexandre Avancini, dos grandes sucessos "Prova de Amor", da trilogia "Os Mutantes", da bem elogiada "A Lei e o Crime", de "Vidas Opostas"...
"Rebelde" tem uma temática jovem e restrita. A história se sustenta no cotidiano de adolescentes que buscam identidade. A produção é limitada. Externas fora da escola e da cidade cenográfica desde a estreia podem ser contadas nos dedos de uma mão. Nunca foi mostrado um revólver sequer.
Já "Vidas em Jogo" acumula uma série de explosões, perseguições, constantes trocas de tiros, sequestros e etc. E o Ibope? Não raramente "Rebelde" bate "Vidas em Jogo". A novela de Margareth Boury oscila entre 9 e 11 pontos de média enquanto a de Cristianne Fridman tem entre 10 e 13 pontos. Só lembrando que tais índices são muito próximos aos de "Ribeirão do Tempo" e "Poder Paralelo", tramas que fugiam totalmente do que sempre havia dado certo na Record. Sinal de desgaste na fórmula?
Por fim, até o próprio "Domingo Espetacular", considerado como prata da casa, tem sentido os efeitos de mudança no comportamento do telespectador e que velhas receitas não funcionam tão bem assim.
Porém, diferente de outros programas, a equipe soube prever o desgaste do processo e passou a recorrer a outras fórmulas. Grandes reportagens relacionadas a assaltos e cenas de violência, por exemplo, deixaram de chamar tanta atenção assim. Há alguns domingos mesmo o "Domingo Espetacular", em um dado momento, estava com 18 pontos contra 20 da Globo. A matéria no ar? Uma sobre os cachorros de famosos.
Há algum tempo mais, em outro momento curioso, a revista eletrônica estava com 21 pontos. Alguma operação policial? Alguma investigação? Não. Era uma matéria que exaltava o sucesso da carreira de Rodrigo Faro. Inclusive, índices similares foram atingidos quando Gugu e Silvio Santos foram homenageados.
Tudo isso serve apenas para ratificar que não existe uma receita para dar audiência na TV. Televisão mexe diretamente com comportamento das pessoas. O telespectador gosta e tem exigido material de qualidade. Mas ele não é mais tão vulnerável como antigamente.
Fazer uma série de reportagens em um dia e exibí-las repetitivamente das 06h às 14h30, passando por todos os programas sem exceção, já não rende mais. Recorrer a tiros nas novelas também não. Poupar intervalos? Até ajuda, mas se o produto não for bom, a audiência não se salva.
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